Após um outubro quente e chuvoso que muito beneficia a agricultura, apesar das previsões de um futuro incerto difundidas no debate orçamental em curso na Assembleia da República (terá havido ali voto de pesar e minuto de silêncio em memória de Adriano?), vamos torcer para que o inverno nos traga a reposição freática da água no subsolo e nas barragens e a primavera ressurja com redobradas esperanças.
Oxalá! Acrescento eu, a fim de os Transmontanos, Valpacenses e demais conterrâneos que residem e trabalham neste Reino Maravilhoso e não só, poderem ver concretizados projetos e expetativas, vividos em sonhos que acalentamos no dia a dia.
Tendo em boa a conta o momento em que alinhavo estas ideias e com o aproximar dos Fiéis Defuntos, dia em que carpimos com dor e saudade a perda dos entes queridos, tenho ainda bem presente a imagem e o exemplo do prof. Adriano José Alves Moreira que há pouco nos deixou. Por isso mesmo eis-me a recordar e reflectir um pouco sobre factos e circunstâncias vividos e presenciados aquando do seu funeral.
Sendo Adriano Moreira um transmontano insigne, distinto e estimado como poucos, e com obra tão abrangente e conhecida, não poderia o seu longo “curriculum”, com registos de grande intervenção pessoal em fóruns transmissores de conhecimento, proporcionar apetecíveis “furos noticiosos” quer a jornalistas quer a “paparazzi” interessados na divulgação das suas ideias?
Quem exerceu altos cargos e funções docentes, como advogado, político, ministro, professor, mestre académico de excelência indiscutível…, sem deixar de ser aquele marido estimado, pai querido e avô longevo de uma família numerosa como a sua, não deveria ter um funeral com honras de Estado, de modo a ser recordado como figura exemplar que foi, durante um século completo (1922-2022) de vida, desde a primeira República e a Ditadura do Estado Novo até à restauração democrática agora usufruída?
Se todos quantos o conheceram e tiveram a dita de seguir os seus doutos ensinamentos ficariam muito gratos se tal tivesse acontecido, que vantagens e recompensa obteriam os que procuram difundir e dar continuidade aos ideais e princípios do professor Adriano Moreira?
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Com base nas informações recebidas acerca do local e horário do velório, no dia 24 à noite desloquei-me ao Mosteiro dos Jerónimos a fim de prestar a última homenagem a quem nos deixava para sempre e apresentar também as condolências devidas à família, mas além de não encontrar ali vivalma e deparar que a Igreja estava fechada, soube depois que o defunto estava depositado na Capela Mortuária na Rua de Belém e que o velório, iniciado às 20h00, terminaria impreterivelmente às 22h00.
Apesar de estar quase em cima da hora, o facto de haver muitas pessoas à entrada da casa mortuária era prova evidente de que os acessos e dimensões do local escolhido eram exíguos e o horário estabelecido para o velório demasiado curto.
Quando imaginava transmitir à família os meus sentidos pêsames e prestar a última homenagem ao meu professor e conterrâneo transmontano, despedindo-me dele até à Eternidade, como as tentativas e planos por mim gizados falharam, não pude concretizar o meu intento!
Algo descontente e frustrado com o que me acontecera e vi naquela noite, regressei a casa com a intenção de voltar logo de manhã no dia seguinte para assim poder levar por diante o que tinha em mente, sem ter de estar sujeito a filas intermináveis e a possíveis intempéries até porque as previsões meteorológicas anunciavam temporal durante a noite.
Tive ensejo de comprovar isso mesmo logo de manhãzinha no dia 25 de outubro. No momento da chegada à capela mortuária a chuva havia parado e o sol radiante que inundava Belém era prenúncio de um bom dia outonal, como de facto veio a suceder.
Com grande espanto meu pude verificar que àquela hora – já passava das 9h30 – havia poucos transeuntes na rua, e assim sem qualquer pressa e o mais descontraidamente possível, pude deixar o meu voto de pesar no livro de condolências e logo após, completamente sozinho depois de sair a pessoa que ali encontrei, pude demorar na capela mortuária o tempo necessário, bem junto das muitas coroas de flores que ladeavam a urna sobre a qual pendia a bandeira nacional.
E ali, refletindo e recordando a importância e o valor que tem a vida e a mágoa que representa para nós o perdê-la, pedi a Deus o Eterno Descanso para o meu admirável e genial professor Adriano Moreira – querido associado e amigo, cuja presença era sempre relevante nas festas e eventos da Casa de Trás-os-Montes e Alto Douro de Lisboa.
Voltei uma terceira vez às 12h00 a fim de assistir e participar, agora com a Igreja dos Jerónimos por nossa conta, na missa presidida pelo Senhor Cardeal Patriarca de Lisboa estando presentes várias entidades políticas, religiosas, civis e militares, entre as quais Sua Exª o Senhor Presidente da República, alguns deputados, dirigentes partidários e várias dezenas de pessoas, entre as quais um grupo considerável de transmontanos.
Foi comovente ver e ouvir a expressão e voz dos entes queridos do finado, com realce para os filhos e netos que ali tiveram mais uma oportunidade para expressar ao pai e avô querido o quanto o amavam.
Tendo bem presente a homenagem que a nossa Associação Regionalista-Casa de Trás-os-Montes e Alto Douro lhe prestara em setembro p.p. por ocasião do seu 100º aniversário, a ideia que formulei quanto ao funeral de tão distinto e digno transmontano era bem outra.
Com base no que presenciamos nos povoados de além Marão quando ali assistimos a um funeral de qualquer pessoa seja rico, remediado ou pobre, que poderia acontecer e não vi em Lisboa?
Nas aldeias transmontanas, por mais despovoadas e pequenas que sejam, quando alguém morre, os seus familiares, vizinhos e amigos, vivam perto ou longe – até mesmo no estrangeiro – aparecem e marcam presença, como prova de solidariedade e união com a família enlutada, para despedir-se do ente querido e estimado que vai para o Além.
Tendo o Prof. Adriano Moreira o valor e importância que todos lhe reconhecemos, porque é que transmontanos, alfacinhas, brasileiros, naturais dos PALOPs…, e demais residentes na Área Metropolitana de Lisboa não apareceram em massa no seu funeral para lhe prestarmos, todos unidos e solidários, a homenagem merecida que lhe era devida?
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